Educação, TICs e diversão
[...]
Incorporar as TICs nas práticas pedagógicas requer mais que oficinas de capacitação para uso de ferramentas (softwares e equipamentos) ou lavagem pedagogico-cerebral, tentando algum tipo de “convencimento” do professor. Talvez essa incorporação requeira um novo modo de olhar o mundo, novas competências criativas e, infelizmente, talvez isso não esteja ao alcance de alguns professores, mas eu não gostaria de ter que tomar isso como premissa. Acho que ninguém gostaria de supor que exista uma “geração perdida” e que, talvez, essa geração seja a nossa.
Vamos exemplificar esse discurso “esquisito”: um dia, talvez inspirado pelas “calçadas rolantes” do Jetsons, alguém inventou a “escada rolante”. Ela é muito útil para mover um número grande de pessoas simultaneamente, para cima ou para baixo, e substitui com grande vantagem os elevadores. As encontramos em metrôs, shopping centers, grandes lojas, etc.
A escada rolante é um excelente exemplo de uma tecnologia que nos torna preguiçosos, pois embora as escadas sejam mais saudáveis (para a maioria das pessoas) é muito mais cômodo usar as escadas rolantes e basta observar o movimento em um metrô ou num shopping center para confirmar que a grande maioria das pessoas opta pelas escadas rolantes quando têm a opção de escolher entre elas e as escadas comuns.
Um professor “tradicional”, desmotivado, mau pago e desacreditado, diria que o problema é que as pessoas hoje em dia tem uma péssima educação, não têm motivação para serem saudáveis e tendem sempre à vadiagem. Ele não perderia seu tempo tentando convencer ninguém a usar as escadas comuns ao invés das escadas rolantes, a menos que pudesse de alguma forma “obrigá-las” a isso. Já um professor deslumbrado com a tecnologia diria que as escadas rolantes são mesmo a melhor opção, pois poupam tempo, evitam desgastes nas juntas dos joelhos e ainda permitem que durante o percurso se possa acessar o twitter ou o facebook. Ele jamais obrigaria alguém a “voltar no tempo”.
Assim, nenhum desses dois professores aceitaria a tarefa de fazer com que as pessoas escolhessem, espontaneamente, a escada convencional. Para ambos isso seria uma bobagem. Se recebessem essa tarefa, fracassariam (e encontrariam culpados facilmente).
O professor que precisamos é aquele que não recusaria essa tarefa e que seria capaz de mobilizar seus conhecimentos, sua inteligência e criatividade para executá-la, ainda que ela não seja trivial. Esse professor é o mesmo que consegue ensinar seus alunos a somarem e subtraírem, com ou sem calculadoras e, acima de tudo, que consegue que seus alunos aprendam sem serem chicoteados.
Causar essa “mudança de hábito” espontaneamente é possível e, se você já está impaciente para saber como, ASSISTA o vídeo abaixo e depois continue a leitura do texto.
http://www.youtube.com/watch?v=2lXh2n0aPyw&feature=player_embedded
Ok, isso não acontecerá em todas as escadas do mundo, não é simples e nem barato para se fazer e, ao fim e ao cabo, se a escada rolante for retirada as pessoas também subirão pelas escadas normais a um custo bem inferior. Mas não é isso que está em questão aqui. O que está no foco desse artigo é a “escada conceito” baseada naquilo que os criadores dessa campanha publicitária chamaram de “The fun theory” (Teoria da diversão) e que baseia-se numa premissa aparentemente sólida: é possível mudar o comportamento das pessoas tornando as coisas mais divertidas.
Ninguém teve que ouvir palestras chatas sobre porque subir escadas pode promover uma saúde melhor, ninguém foi obrigado a subir pelas escadas convencionais porque lhe proibiram subir pela outra. Todos podiam optar pela escada rolante, se quisessem, e só não quiseram subir por elas aqueles que acharam “mais divertido subir pela escada piano”.
Não é fácil ter uma idéia criativa como essa, mas se você consegue tê-la pode usar a própria tecnologia a seu favor para torná-la possível. Também não é fácil para o professor ensinar o aluno a somar e subtrair (se fosse fácil, para que precisaríamos de professores?), mas é possível que alguns professores tenham idéias brilhantes sobre como fazê-lo.
Pode ser mais divertido jogar um videogame com adições e subtrações no telefone celular do que copiar continhas da lousa e fazer no caderno centenas de operações de somar e subtrair aparentemente sem nenhuma razão; talvez as somas e subtrações possam ser contextualizadas, mesmo sem muita tecnologia digital; talvez possam estar inseridas em situações-problema do cotidiano do aluno… Só o professor que não desiste sem antes tentar é que poderá ter a oportunidade de descobrir qual é o melhor caminho para isso fazendo uso de toda tecnologia que dispuser. E fazer bom uso das TICs para ensinar mais e melhor é exatamente o que podemos chamar de um “bom uso pedagógico das TICs”.
O uso pedagógico das TICs pode ser um caminho promissor para tornar o aprendizado escolar algo menos enfadonho e, talvez assim, consiga resgatar em alguns momentos a “diversão de aprender”. Pode não ser fácil encontrar soluções inteligentes e criativas o tempo todo, mas, podemos compartilhar as boas idéias de maneira a construirmos um conhecimento em rede. É a isso que chamamos de Sociedade do Conhecimento (não uma sociedade que conhece tudo, mas uma sociedade que constrói e compartilha conhecimento de forma eficaz por meio de redes sociais interativas).
Ao professor também cabe construir tecnologia e compartilha-la. Não estamos falando de aparelhinhos tecnológicos, mas sim de tecnologias de ensino que possam tornar o aprendizado mais divertido, interessante, criativo e inteligente. Afinal, há uma boa chance de que um novo ensino, inteligente e criativo, ajude a desenvolver essa nova geração, preguiçosa como a nossa, mas também muito inteligente e criativa, para que a seu tempo ela possa assumir a condução dessa sociedade estranhamente tecnológica onde vivemos hoje.
ANTONIO, José Carlos. Educação, TICs e diversão, Professor Digital, SBO, 08 janeiro 2012. Disponível em: http://professordigital.wordpress.com/2012/01/08/educacao-tics-e-diversao/>. >Acesso em: 20/01/2012
Nenhum comentário:
Postar um comentário