Com forte potencial para aplicações educacionais, as redes sociais ainda não ganharam status como instrumentos pedagógicos. falta compreensão de que a metodologia deve vir antes da tecnologia. Áurea Lopes
Trechos da reportagem da revista AREDE. Leia a reportagem completa em:
http://www.arede.inf.br/inclusao/edicoes-anteriores/184-edicao-no-74-outubro2011/4797-entrevista
ARede nº 74, outubro de 2011 - Muitos pais e educadores não sabem o que são, de fato, as redes sociais. Ficam imaginando o que acontece nesse “lugar” de onde os jovens não arredam pé e onde acontecem casos de polícia, com os quais a mídia convencional “amedronta professores e pais”, como diz a educadora Sônia Bertocchi. Redes sociais são espaços de encontro, com enormes possibilidades de estimular e enriquecer a aprendizagem, alerta a especialista, que vai tratar desse tema em novembro, durante o 6º Encontro Internacional EducaRede, em Madri, promovido pela Fundação Telefônica - evento que ajuda a elaborar. Nesta entrevista, Sônia alerta: “O primeiro passo é estabelecer uma diferença entre tecnologia e metodologia. Hoje, a preocupação maior é com a tecnologia”, aponta.
Você pode explicar o conceito de rede social? Dá para fazer uma analogia, por exemplo, com a rua de antigamente. Um lugar onde se encontrava os vizinhos, os amigos?
Sônia Bertocchi – Para mim, é bastante simples: trata-se de uma plataforma. Um conjunto de ferramentas que facilitam a comunicação entre pessoas. Essa plataforma coloca as pessoas em contato umas com as outras. Portanto, uma rede social é, sim, um espaço de encontro. Mas é acima de tudo uma ferramenta que proporciona a possibilidade de comunicação, de contato. Só que a rede, em si, não é responsável pelo contato. O fato de existir a plataforma não significa que aconteça o contato, o relacionamento, como a gente imagina que vá acontecer. Por exemplo: eu clico em tal botão, me comunico com um amigo e esse amigo me indica outro amigo.
A ferramenta facilita o contato. Mas não quer dizer que eu vou ficar amiga do amigo do meu amigo. A mesma coisa acontecia na rua. Eu conheço o Joãozinho, que me apresenta o Luizinho. Eu posso ficar ou não amiga do Luizinho. Só que a tecnologia potencializa essa rede de amigos, no tempo e no espaço. Mas não vejo a rede social como uma coisa nova. As pessoas se relacionam do mesmo jeito. Assim como as mulheres sentavam na calçada para conversar sobre o almoço, os filhos, contavam da vida.
Os homens iam para o bar, falavam de futebol, de trabalho. Isso acontece hoje, no mundo virtual, por meio das redes segmentadas.
Se eu quero falar de trabalho, tenho o Linkedin.
No final de semana, falo de coisas mais leves no Orkut.
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As redes sociais servem para educar?
Sônia – As redes sociais são instrumentos pedagógicos riquíssimos. Não tem como ir contra uma tecnologia em que o jovem pode ter voz, ser autor. Mas ainda não há nada sobre essa tecnologia nos currículos oficiais do ensino público. Existem iniciativas isoladas. Por exemplo, na cidade de São Paulo, o secretário de Educação, Alexandre Scheinder, é tuiteiro, tem afinidade com as novas tecnologias. As escolas da rede paulistana têm mais facilidade para emplacar ações, projetos que usem redes sociais. Ou seja, ele não cria barreiras, é permitido usar rede social na escola... Na cidade do Rio de Janeiro, a secretária de Educacão Claudia Costin também tuita, ela própria, não tem um avatar. Ela fala direto com os professores, desde as seis da manhã! E o que aconteceu? Hoje você tem uma rede da educação na cidade que se formou espontaneamente.
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Como conquistar os professores para trabalhar com redes sociais se grande parte ainda não consegue usar sequer desktops ou notebooks em sala de aula?
Sônia – A base de tudo é a metodologia. O primeiro passo é estabelecer uma diferença entre tecnologia e metodologia. Hoje, a preocupação maior é com a tecnologia. Se você propõe a um professor utilizar um Ipad, ele responde: eu não sei usar o Ipad, não conheço as funções. Aí o professor diz que precisa de formação, de treinamento para dominar a ferramenta. Isso acontece porque ele só está olhando para a tecnologia. O professor tem de se preocupar, da mesma forma, com a metodologia. Olhar para o dispositivo não como um aparelho. Mas a partir das funcionalidades possíveis. Então, é olhar e pensar: esse dispositivo facilita a comunicação. Assim não se está mais pensando em um equipamento, mas em um conceito. Eu quero que meus alunos se comuniquem? Quero. Por que não usar uma tecnologia que potencializa isso? Eu continuo querendo que meu aluno aprenda a ler, que aprenda geografia. Na medida em que os educadores começarem a enxergar mais a metodologia, por trás do equipamento, vai ficar mais fácil quebrar essa resistência. Atualmente, o que mais falta é alguém que pense nas metodologias.
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Não existe também uma resistência do professor, que precisa ser vencida?
Sônia – Sem dúvida. Conheço professores de 27 anos que acham que rede social é “coisa da nova geração”. Eu tenho 60 e acho que é da minha geração, do meu tempo. Eu tenho que encarar o caixa eletrônico no banco, tenho de mandar o Imposto de Renda pelo site da Receita Federal... então, a tecnologia é coisa do meu tempo. Acho uma irresponsabilidade o professor que se nega a absorver esses recursos. Eles ficam bravos quando eu falo, mas isso acontece com frequência. Penso também que o professor precisa conquistar as coisas. Na vida, não dá para ficar só esperando, cobrando do governo melhores condições, de braços cruzados. Hoje, a sociedade se mobiliza – em grande parte, pelas TICs – para colocar suas demandas. E consegue vitórias. Derruba projeto de lei, adquire direitos... São os movimentos sociais. Na escola, tem de ser assim. Primeiro, se interessar; depois, se organizar; e então, reivindicar. Os projetos que eu tenho visto dar mais certo são aqueles em que o professor toma a iniciativa, começa a desacomodar o diretor, a “criar o problema”.
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